Hegemonia do século XXI

 

Considera-se que no século XIX foi do Reino Unido e o século XX foi dos Estados Unidos, as duas maiores economias do globo na Primeira e Segunda Revolução Industrial, respectivamente. Além disso, essas duas potências, cada uma na sua época de apogeu, controlavam ou influenciavam grande parte do que ocorria no mundo : o comércio internacional, os principais conflitos,etc.

E no século XXI, de quem será a hegemonia mundial?
Há quem afirme que ela ainda será norte-americana, enquanto alguns acreditam que será européia e outros que será da Ásia, talvez comandada pelo Japão, China ou pela Índia. Muitos argumentam que nenhum desses três pólos ou centros mundiais terá a hegemonia, e que o século XXI será equilibrado, multipolar e sem um centro dominante.
É interessante registrar que praticamente ninguém aposta numa supremacia da América Latina, da África, do sudoeste e do sul da Ásia e nem mesmo da Oceania ou da Rússia e dos demais países co CEI. Por que será?
Vamos agora examinar os pontos fortes e fracos da Europa, Estados Unidos e Japão, avaliando as chances de cada um de se sair bem no século XXI.

Europa

E Europa – ou melhor, União Européia – tem grande possibilidade de voltar a ser o centro mundial de poder, posição que teve desde o século XVI e só perdeu no século XX, notadamente  com as duas guerras mundiais. O grande desafio de suas lideranças é integrar na União Europeia todo o continente, ou seja, a Europa Oriental e as nações européias da CEI ( Rússia, Belarus , Ucrânia e Moldávia).
O ponto mais forte da Europa é a sua população : cerca de 730 milhões de habitantes com bom poder aquisitivo e elevada escolaridade, a maior de todos os continentes. Isso é fundamental, pois na atualidade os recursos humanos, as pessoas, são mais importantes que os recursos naturais e mesmo o poderio militar. Até os países mais pobres da Europa, como a Albânia, sempre valorizaram a educação, e a situação européia nesse aspecto é excelente, melhor do que de qualquer outro continente, desde que se compare à situação média.
A Europa conta ainda com uma economia moderna, que já atingiu em várias regiões o estágio da Terceira Revolução Industrial e produz tudo, desde supercomputadores até vinhos.
Um ponto fraco da Europa é a grande heterogeneidade ou as diferenças de povos e culturas, que originou rivalidades milenares, provocou inúmeras guerras e que é, portanto, uma situação difícil de resolver.
Caso a União Europeia integre os países ocidentais da CEI, amenize as rivalidades milenares e consiga promover uma coexistência pacífica e democrática entre as minorias étnicas, a Europa provavelmente voltará a ser  uma espécie de centro (econômico e talvez até político e cultural) do mundo do século XXI

Estados Unidos

Se a disputa pela hegemonia mundial fosse apenas entre Estados nacionais ou países, sem dúvida os Estados Unidos levariam vantagem. Apesar da crise de 2008, o país ainda é a maior economia do mundo e o maior mercado nacional de consumo no globo, com uma população de mais de 305 milhões de habitantes e alto poder aquisitivo médio embora o nível de alfabetização, embora elevado para o padrões mundiais, seja bem inferior ao de países como Alemanha, Japão ou Suécia.
A disputa no século XXI, porém, não é mais apenas entre Estados, mas sim entre megablocos, dos quais o mais importante é a União Europeia. Esse é o grande problema dos Estados Unidos, que preferem continuar atuando de forma independente no plano internacional. Esse Estado, provavelmente, nunca concordará em construir uma associação semelhante à União Europeia, em que há uma integração quase total (econômica, política e futuramente até militar) entre os países membros. Sua preferência é por liderar, de cima para baixo, zonas de livre comércio (ou seja, uma associação apenas econômica – ou melhor, comercial - , em que não há integração política nem livre circulação de mão de obra.
Os Estados Unidos criaram, junto com o Canadá e o México, o Nafta, que até hoje suscita reações contrárias em grande parte da população e dos políticos do país. O Nafta não avança, não se expande, continuamente, como ocorre na Europa ( onde se investiu pesadamente na modernização das regiões mais pobres, criou-se uma moeda única, uma cidadania comum entre os povos, uma intensa liberdade de mão de obra para trabalhar livremente em qualquer um dos países membros, etc).  Da mesma forma, os Estados Unidos, na condição de maior economia de todo o continente americano, lideram a criação da Alca  - Área de Livre Comércio das Américas. As negociações para a formação desse bloco econômico, cujo objetivo seria eliminar, paulatinamente, as tarifas alfandegárias entre os países membros. Iniciaram-se em 1994 com a Primeira Cúpula das Américas, reunindo chefes de Estado de 34 países. Porém, a implantação da Alca encontra resistência  por parte de alguns países, entre eles o Brasil, que desconfiam das intenções dos Estados Unidos de tirar vantagem do acordo, interessado penas em abrir novos mercados para suas exportações, e não promover o fortalecimento do continente como um todo. Por esse motivo, até 2006, as negociações encontravam-se num impasse.
Há um avanço constante de problemas comuns a toda a humanidade, uma globalização que enfraquece o poderio de cada Estado, uma expansão de megablocos com grande integração entre os membros, algo que também diminui o poderio dos Estados nacionais isolados.

Japão

O Japão saiu na frente na Terceira Revolução Industrial, no fim dos anos de 1970 e nos anos 1980. Foi o país que mais investiu em tecnologia, especialmente em robótica, nesse período. Ele ainda possui mais robôs que qualquer outro país do mundo e, na segunda metade do século XX, como vimos, foi a economia que mais cresceu e se modernizou em todo o planeta. O país, que nos anos 1950 era atrasado em microeletrônica, em informática e em outros setores avançados, nos anos 1980 era o líder mundial na maioria deles. O Estado japonês construiu o melhor sistema escolar público do mundo nos anos 1970 e 1980.
Em 1990, a maioria dos especialistas considerava o Japão o principal candidato a se tornar a maior potência mundial no século XXI. Desde então muita coisa mudou. O fim da bipolaridade e da guerra fria prejudicou o Japão, pois o término do “mundo socialista” fez com que os Estados Unidos começassem a se preocupar com a ameaça econômica japonesa. Nos anos 1960, 1970 e 1980, os Estados Unidos viam o Japão como um importante aliado na luta contra o comunismo – e até auxiliaram enormemente a reconstrução econômica desse país nos anos 1950,já que era necessário mostrar aos povos asiáticos que o capitalismo era melhor que o socialismo – e não davam maior importância às práticas de dumping – consiste num processo que visa incentivar exportações vendendo no exterior produtos a baixos preços, que muitas vezes nem cobrem os custos de produção; tem como objetivo eliminar a concorrência-, nem aos constantes e imensos déficits que tinham anualmente nas relações comerciais com o Japão.

China e Índia

China e Índia costumavam ser vistas pelo resto do mundo como os “grandes adormecidos”, países com enormes populações (mais de 1 bilhão cada um) e grande territórios ( embora a Índia seja bem menor do que a gigante China, também é um país de grandes dimensões).
A China, hoje, desperta mais atenção ( e até temor por parte de alguns, já que não é um Estado democrático) do que a Índia. Esta, porém, vem se modernizando em ritmo bastante rápido. Provavelmente, o único Estado nacional - e não um “bloco” como a União Européia – que poderia ameaçar a hegemonia norte americana num futuro próximo (até 2050) é a China, desde que ela consiga manter o seu alto nível atual de crescimento econômico e resolver os seus graves problemas étnicos e sociais : importantes movimentos separatistas, as enormes desigualdades regionais e sociais que continuam a crescer, a pobreza e o baixo nível aquisitivo da imensa maioria da população, entre outros.
A China tem, pelo menos teoricamente, maiores probabilidades que o Japão de liderar um hipotético megabloco asiático. Sua cultura é mais disseminada pela Ásia – existem dezenas de milhões de chineses vivendo em Cingapura, na Coreia do Sul, no Vietnã, no Laos, na Índia e em vários outros países vizinhos -, além de não ser tão malvista pelos povos asiáticos quanto o Japão. Assim, o país seria uma espécie de candidato natural a essa liderança devido à sua crescente população e ao seu acelerado crescimento econômico, o maior do mundo desde a última década do século XX. O maior problema é o autoritarismo do regime político chinês, de partido único e sem eleições livres, além de uma imensa censura à imprensa e até mesmo à internet (existem sites – aqueles que abordam temas relacionados a direitos humanos, prisões arbitrárias e tortura, prisioneiros políticos, etc – que não podem ser acessados na China). Essa política assusta os vizinhos e cria forte resistência, pois nenhum país quer ser liderado por um Estado autoritário. Com exceção do Japão, o único país que poderia desafiar seriamente a China na pretensão de ser a grande potência asiática é a vizinha Índia, a segunda maior população do mundo (e talvez a primeira daqui a quinze ou vinte anos, pois o seu crescimento demográfico é maior do que o chinês) e que, desde os anos 1980, também vem se modernizando muito. Porém, assim como a China, a Índia enfrenta sérios problemas étnicos, sociais e político territoriais. Ambos os países, notadamente a China (por causa de seu regime político), talvez sejam uma espécie de” barril de pólvora” prestes a explodir, principalmente quando o crescimento da economia diminuir de maneira  significativa. Existem minorias étnicas que querem se separar da Índia  e da China. Há violentos conflitos internos ( na China ainda são reprimidos e abafados com enorme violência e, por isso, podem explodir futuramente com maior intensidade) e também externos, de fronteiras com o Paquistão e com a própria China, e esta, por sua vez, tem sérios conflitos fronteiriços com a Índia, a Mongólia, a Rússia e outros países da CEI, como o Casaquistão.
Tanto a China quanto a Índia têm grandes contingentes humanos vivendo em condições precárias, mas na Índia as desigualdades sociais, de acordo com recentes estatísticas, estão diminuindo, ao passo que na China vem ocorrendo o oposto. Além disso, a economia chinesa atual é mais dependente do exterior, notadamente do mercado consumidor norte americano,que a indiana. A Índia tem uma imensa indústria cinematográfica, a segunda maior do mundo ( atrás apenas da norte americana, e por esse motivo apelidada de Bollywood), quase totalmente voltada para o consumo interno. O país também dispõe de uma importante e crescente indústria de softwares. Já as principais e mais dinâmicas atividades industriais da China, ao contrário da Índia, foram construídas em grande parte com capitais estrangeiros e destinam-se basicamente ao mercado externo.

Áreas periféricas

As nações da América Latina, da Ásia em geral ( exceto Japão, China, Índia e os Tigres Asiáticos) e, principalmente, da África são vistas como os eternos candidatos a retardatários, e perdedores na nova ordem mundial.
Existem alguns problemas comuns nesses países:
- Governos incompetentes ( com freqüência corruptos) e que investem muito mal os seus recursos;
- Sistemas escolares precários;
- População em geral com baixa escolaridade;
- Enormes desigualdades sociais.
Por outro lado,existem grandes diferenças entre essas nações e entre  elas e outras regiões do globo.
A África ao sul do Saara é a região com maiores problemas. Os níveis de pobreza, subnutrição, baixa escolarização, etc., são em média os mais elevados do mundo. Aí é preciso começar quase do zero : criar boas universidade e institutos de pesquisas, construir sistemas escolares para a maioria da população, reformar e modernizar completamente a agricultura para que ela alimente adequadamente a população, industrializar as matérias primas (minerais, agrícolas) para que as exportações não sejam quase somente de produtos primários, cujo valor é baixíssimo no mercado internacional.
Mas como fazer isso tudo se não há recursos? Como investir nesses setores se a população cresce em ritmo intenso e a produção econômica, salvo raríssimas e temporárias exceções, não acompanha esse ritmo? E como tentar modernizar o Estado - Nação se não existe nacionalismo?  Praticamente todos esses países são artificiais, ou seja, uma junção arbitrária de inúmeras etnias que têm idiomas e culturas diferentes.
Esses são os principais dilemas da África subsaariana para o século XXI. O grande laboratório dessa região do globo, o Estado que poderá indicar o caminho para as demais, é a África do Sul, a verdadeira potência regional desse conjunto de países. Além de ser a economia mais industrializada do continente, a África do Sul é o lugar onde atualmente se tenta construir a primeira experiência de democracia multiétnica, em que brancos, asiáticos e africanos de diversas etnias ou culturas procuram viver em harmonia e com eleições periódicas e livres. Se essa experiência for bem sucedida, pois ela ainda está começando, poderá servir de exemplo para a África subsaariana, onde o autoritarismo e os permanentes conflitos étnicos geralmente atrapalham enormemente a modernização da sociedade.
A situação da América Latina não é tão precária. Existem aqui economias bastante industrializadas – notadamente no Brasil, no México, na Argentina, etc – e também alguns bons sistemas escolares, universidades e institutos de pesquisas, que em parte foram semidestruídos nos anos 1970 e 1980, principalmente pelas ditaduras militares, mas que podem ser recuperados e expandidos. O grande desafio é modernizar o poder público,os governos em todos os níveis, que, salvo raríssimas exceções, são extremamente ineficazes e corruptos – eles mais atrapalham que ajudam a modernização da economia e da sociedade – e distribuir melhor a renda, de forma que não haja tanta desigualdade. As reformas necessárias para o desenvolvimento da América Latina em geral  não são tão problemáticas quanto a África – elas são possíveis e desagradam apenas a grupos extremamente minoritários. Ademais, o crescimento populacional nesse continente é em média bem menor que na África e na maior parte da Ásia, e o crescimento econômico , que praticamente não existiu durante pelo menos quinze anos (1980 a 1995), parece que começa novamente a ocorrer. Mas aqui as diferenças nacionais são bem mais pronunciadas : há países com péssimas condições ( Haiti, República Dominicana, Nicarágua) e países com boas condições de vida (Costa Rica, Bahamas,Uruguai, Chile).